24
janeiro
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Profissionais Liberais
Administração para não administradores: os desafios dos profissionais liberais

Encontrei essa entrevista do consultor de empresas e autor de diversos livros Fábio Zugman no site Administradores.com e decidi compartilha-la com você por acreditar que ele entende muito bem a realidade de quem é profissional liberal e que precisa se dividir entre a gestão e a execução de seu trabalho.

Em entrevista ao Administradores.com, Fábio dá algumas dicas para esses profissionais e conta – com a experiência de quem acompanhou de perto a atuação de muitos deles – quais são os grandes desafios de exercer uma atividade específica e, ao mesmo tempo, administrar o negócio que a viabiliza.

Para profissionais liberais como médicos, advogados e contadores, administrar seus consultórios ou escritórios é uma atribuição a mais na sua rotina diária de trabalho. Como conciliar a atividade administrativa com a profissão que exercem?

Eu defendo que não se deve conciliar no sentido de “combinar”, mas sim de “harmonizar”. Em primeiro lugar, a atividade administrativa faz parte da profissão dessas pessoas. O problema é que a maioria das escolas – e boa parte dos próprios profissionais – se esquece disso. Por isso resolvi chamá-los de “empreendedores esquecidos” em meu segundo livro sobre o tema.

A grande diferença desses empreendedores é que sua atividade principal não está ligada diretamente ao ato de administrar. Se alguém sonha em ter uma rede de restaurantes, por exemplo, grande parte do tempo é aplicada administrando os restaurantes existentes, nos planos de expansão etc. Se alguém sonha em ser médico, advogado, contador, ele sonha em atender pacientes, trabalhar em casos interessantes ou ajudar seus clientes em seus problemas. As tarefas ligadas à administração em si tornam-se secundárias. Como os profissionais liberais colocam uma grande ênfase em suas habilidades, muitas vezes veem as tarefas administrativas como “a parte chata” que os impede de exercer sua tarefa principal. Isso é um erro. Eu costumo dizer para essas pessoas que elas devem enxergar a tarefa administrativa como uma higiene que fazem em suas profissões – algo que as permite trabalhar melhor.
O exemplo clássico é simples. Basta pensar na última vez em que você foi mal-atendido em um consultório médico. Ótimos profissionais se prejudicam todos os dias oferecendo uma sala de espera desconfortável, atrasando rotineiramente o atendimento, se localizando em locais de difícil acesso aos seus clientes, assumindo uma atitude superior e assim por diante. Essas pessoas pensam que somente a habilidade técnica importa, mas isso não é verdade. Os clientes não são especialistas na área do profissional e pegarão qualquer dica de mau atendimento como um sinal da qualidade do profissional.

O que procuro ensinar, então, é que o profissional entenda que passando algum tempo administrando seu negócio sentirá a diferença na profissão que escolheu para sua vida. Ninguém precisa deixar de ser médico, advogado ou dentista para administrar melhor sua prática, basta separar um tempo periódico – uma vez por semana que seja – para trabalhar em sua atividade como o dono do negócio em si e não como o especialista. Com esse olhar de dono, ele passa a olhar o atendimento, o lado financeiro e todas as questões que envolvem criar um negócio cada vez melhor para as pessoas que resolveu atender. A questão é que as duas coisas andam de mãos dadas. Bons profissionais administram bem o seu negócio e acabam se tornando cada vez melhores profissionais justamente por causa disso.

Você não acha que com a dupla atribuição o profissional acaba correndo o risco de perder o foco em uma das atividades e exercer mal um delas (ou as duas)? Como evitar esse tipo de problema?
Não acho que seja um problema, nem que sejam duas profissões. Cada pessoa possui um caminho a percorrer e deve tentar lidar com ele da melhor forma possível. Se tornar um bom administrador não significa se tornar um administrador profissional, em horário integral. Esses já existem trabalhando nas empresas. O problema é fazer a pessoa enxergar que, se tornando também um administrador, ainda que somente por algum tempo durante sua rotina, ele também se tornará um melhor profissional.
Um consultório ou escritório é uma atividade econômica como qualquer outra. Se o negócio dá lucro, o dono pode usar o dinheiro para melhorar seu atendimento, oferecer novos serviços, inovar, se atualizar e até levar mais dinheiro para casa no fim do mês. Um negócio mal administrado irrita e afasta clientes, torna o profissional uma opção como qualquer outra, faz com que ele tenha espaços em sua agenda em que não atende ninguém.
É como uma bola de neve, para os dois lados: quanto melhor administrado, mais recursos para o profissional investir em sua prática. Quanto pior administrado, menos recursos. A longo prazo, isso faz a diferença entre os grandes profissionais, os medíocres e os que ficam para trás.
Não é uma questão de perder o foco, mas sim de criar harmonia na profissão que escolheram. Mesmo os profissionais que não possuem o próprio negócio precisam pensar em questões como carreira, que especialização escolher, como lidar com os clientes etc.
Ninguém pode ser bom em tudo, e algo importante aqui é aprender o suficiente para poder delegar algumas partes de seu negócio. Por exemplo, recentemente surgiu uma enxurrada de livros ensinando “leigos” a investir na bolsa. Em meu livro eu falo fortemente contra isso. Não acho prudente aconselhar um profissional que passa o dia inteiro dedicando-se à sua prática profissional que, ao chegar em casa, ligue o computador e escolha meia dúzia de ações. Nesse caso, nosso amigo profissional estará competindo com equipes de gestores, que passam o dia inteiro debruçados sobre a bolsa de valores, possuem formação na área etc. Se quiser comprar algumas ações por diversão, ótimo. Mas é besteira achar que vai enriquecer com isso, ou arriscar grande parte de seu patrimônio em uma aposta do gênero.
Então, o papel do profissional, como empreendedor, é aprender os princípios das finanças pessoais para planejar seu futuro. Escutar, entender e discutir as questões colocadas por seus gerentes de banco e contadores e até escolher um bom fundo de investimento. O mesmo vale para todo o resto. Ninguém precisa se tornar especialista em marketing para perceber que sua imagem está ruim e contratar alguém para lidar com isso. Administrar, lembro, não é fazer tudo ao mesmo tempo, mas sim se organizar para que as coisas sejam feitas.

Qual a importância do elemento “gestão do tempo” na rotina dos profissionais liberais que administram seus próprios negócios?
O tempo é o bem mais precioso do profissional liberal. Para a maioria dos profissionais liberais, estamos falando de serviços que não podem ser estocados, armazenados, nem vendidos em grande quantidade em apenas um momento. Um profissional liberal possui apenas uma quantidade limitada de tempo em sua agenda. E deve pensar não só no tempo aplicado atendendo clientes, a “hora da verdade” em que ele realmente exerce sua profissão, faz aquilo que ama e cobra algum dinheiro por isso. O tempo do profissional deve ser pensado para atividades como a administração do negócio, a capacitação do profissional (ou profissionais) envolvidos no negócio, networking, entre outras atividades. Frequentar um congresso, por exemplo, pode ser uma ótima oportunidade de se atualizar e fazer contatos. Enquanto está fazendo isso, no entanto, o profissional está deixando seus clientes de lado e precisa lidar com isso.
Outra questão importante é lidar com os “espaços” que inevitavelmente surgem na agenda desses profissionais. O que fazer, por exemplo, quando um cliente falta e abre-se um espaço de uma hora durante o dia? Há formas do profissional liberal se planejar para lidar com essas questões.

Para os profissionais liberais que nem sempre têm a necessidade de administrar um empreendimento gerir a própria carreira é mais fácil? Por quê?
Não acho que seja uma questão de graduar entre fácil e difícil. Cada profissional deve seguir seu caminho da melhor forma possível. Músicos possuem públicos, caminhoneiros e motoboys possuem clientes, e assim por diante.Todo profissional precisa entender o mercado, pensar em como se posicionar nele, equilibrar atividades de atualização, divulgação, tentativas de inovação e assim por diante. Não importa a atividade que você exerça, de vez em quando é preciso tirar a camisa de “técnico” do assunto, e pensar em si mesmo como empreendedor de sua vida e carreira.

*Fábio Zugman é professor universitário, consultor e palestrante. É autor dos livros Empreendedores esquecidos (Elsevier, 2011); Administração para profissionais liberais (Elsevier, 2005); Governo eletrônico: saiba tudo sobre essa revolução (Livro pronto, 2006); O mito da criatividade (Elsevier, 2008); e coautor de Dicionário de termos de estratégia empresarial (Atlas, 2009) e Criatividade sem segredos (Atlas, 2010).

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